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quarta-feira, 25 de novembro de 2009




APURO

alfinetadas
são como carcaças do luzir
que circundam ruas
e carrosséis

e os crepúsculos
que vagueiam pelas mentes fúnebres
são tão mesquinhos
e radiantes de esquecimentos

assim
o profano que a platéia aspira
não esconde o andor
que a mentira escala

e o cordão
que saracoteia penumbras e retinas
é como o olhar
que a lua censura
e exala.

Cgurgel



IN E IANQUE

brincar
é uma coisa séria

e levar tudo a sério
é uma brincadeira.

Cgurgel

segunda-feira, 23 de novembro de 2009




MIASMA

quieto
me entrego
ao mistério da noite

feito
um gato
que mia
e chora

por sobre as praças abandonadas
e o povo morrendo de fome.

Cgurgel



BÊBADO BAILE

cambaleante estão todas as rosas
prisioneiras de um tempo
que costura mãos e mentes

assim como todas as procissões
que carregam pelos mares
o vazio de uma aldeia

e quem dança
por sobre o aceso fogo
são todos os pescadores
das ilusões perdidas

irmãos de um trilho do trem
que assim tão desmiolado
devora a fina flor
do que desse mundo partiu

e no fim do mundo
as madames tão perfumadas
e solitárias
em uníssono
envelhecem a selvageria
por sobre cactus e porões.

Cgurgel

terça-feira, 17 de novembro de 2009




PLATAFORMA

sou
de uma cidade distante
que cataliza
avenidas e charcos

como
uma lágrima sanguinária
que abocanha
estações e sacrifícios

vestida do vento
como emissário
de pedaços de mim

que cantarola riffs
uma anunciação de
pecados e segredos

uma cidade
assim
tão diferente
como o hino
de quem partiu para sempre

e o seu sono
por ser tão profundo
aproxima abismos e séculos.

Cgurgel



NICHO

uma ave
quando voa
é sinal de esperança

procurando
pela lembrança
que deixou
em algum lugar

uma ave
quando lembra
que existe
vira bicho

vai
ao encontro
do suor
e da luta

perseguindo o vento
e o reconhecimento
da sua trilha

uma ave
quando voa
e quando
se sente
sem
rumo

é como uma luz
que cega

e
do que
o coração
e a coragem
é capaz
e pega.

Cgurgel

domingo, 15 de novembro de 2009


  PARTIDA

se distancia
foge
e some.

Cgurgel



EU

fujo
como
quem
foge
de si

com medo
de encontrar
pela noite
meus olhos
estupefactos

e de
não mais
querer lidar
com os
sussurros
do escuro

fujo
como quem
foge
de mim

como tudo
que me cerca
e eu
vou embora.

Cgurgel

sábado, 14 de novembro de 2009




ORATÓRIO

encurva
teu corpo
e pede

pela raça
tão sem graça

abatida
esquecida
tão sofrida

pede forte
quente
sem profundo corte

clama
pela paz
pelo azul
branco
com todo gás

e vai
como uma bandeira
que desfralda
uma cantiga amiga
fogo, uma labareda
uma fogueira.

Cgurgel

terça-feira, 10 de novembro de 2009

NÁ OZETTI -  " Adeus Batucada  "




PERSONA

vago
sem sê-lo
como
quem vai
e permanece

entro
e não saio
por sobre
o ponto
que me
persegue

olho
e me cubro
como
um vulto
que não se vê

durmo
e acordo
por sobre
sombras
que em mim
desaconteçem.

Cgurgel



ENTARDECER

a tarde
tão triste
vestida
de arrebóis

na sombra
da sala
os meus passos
vestidos
de ausência

e por sobre
as horas
os meus olhos
cobertos
de nuvens.

Cgurgel

segunda-feira, 9 de novembro de 2009




NAVEGO

eu rondo
como
se fosse
um louco pavão

que derriba
a nostalgia
e invade
barcos e mansões

que entra
pelos meus pulmões
e adormeço
de tanto medo

e a ronda
que do mastro
vai ao mar

inclina
profetas
parecido
com
aquela lua
que me olha
e me vigia.

Cgurgel
ARNALDO BAPTISTA/MOISÉS SANTANA  -  "Cê Tá Pensando Que Eu Sou Loki?"

domingo, 8 de novembro de 2009




VERGONHA

nossas comunidades
estão todas
consumidas pelo tempo

pela manhã
ainda o sono que persiste
como encobrindo
o temor da realidade

pela tarde
o sentido da sobrevivência
em saciar a fome
entre o gelo que já não mais existe
e a seca
que assola
solos e sóis

e
pela noite
a hora de recolher
o tremor que grassa
o grão do chão
tão irreconhecível
como o medo
que circunda
esse mundo.

Cgurgel



O SER QUE SE FOI

esse é o fio tênue
que me liga a vida

o que me leva de encontro
aos últimos rituais
que o meu corpo se dispõe a fazer:

uma intensa vigília
por sobre todos os testamentos

do inconsciente que rege
os órgãos que capitulam
promessas e falsas memórias

como um cadafalso
que prima
pela desordem emocional

uma corrida
contra o templo da afeição

assim retorno
do meu frugal passo:

uma ave que chora
ao redor
dos seus rochedos
e brutais abismos

azáfama
de poucas
e mutiladas pupilas

impregnada
pela força
que o meu deslize
adoece

empalhe
de risos e respirações

um fôlego
que rouba luar
e poços de ternura

e a melancolia
que corre solta
por cima do morro
que cobre meus ombros.

Cgurgel

sábado, 7 de novembro de 2009




OPUS

o bolor
que o mundo exala
é como uma
tocha de fuga

urdimento
de cavernas e cadáveres

como frisson que fere a fé

tanto déspota capitulando de drenos

um furacão
dizima a sombra de faces
como quem vai
para a rua e não se veste

uma ópera do cáos
perfila o suor que escorre
de um filete
obscuro e intangível

poeira que cobre
lentos esqueletos
que se destrincham uns dos outros

o silêncio
de uma terra morta
lágrimas de línguas partidas
um infortúnio de léguas e párias

labaredas que embalam
cais e navegações
enxerto do ar rarefeito
boca seca

o lixo de uma civilização
que se acostumou
com o vazio
dos seus braços

mal dizer de um gesto fortuito
padecimento do chão
que já não aguenta mais

lamparinas
são como velas soltas
no oceano dos nossos cetros

como
uma carne trêmula
de tanto tentar
avenidas que se olham e choram

xamã
de um gás
que invade corações
e leitos

assim
aqui
de fora
parece que a esperança
ainda resiste.

Cgurgel

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

chuva




TÍTERE

sou
pirilampo
que da minha
boca
roça

sou
fundo do mar
que da minha
espinha
coça

sou
a serpente
do sertão
que
pela noite
força

sou
um buscapé
que
de tanto
sonhar
possa.

Cgurgel



TURVO  ONTEM

pessoas passam ao meu redor
o mandacarú flora
a ponte tão velha e esquecida
um balanço que o vento reconta

naquela esquina fogos espoucaram
carros de latinhas do leite nestlé
me lembro de tudo como se fosse hoje
subo no pé de cajarana e me farto

a igreja aos domingos e seus pecados
relembro serpentina e o perfume da lança
conto postes, quintais, pirulitos e bonsais
ao meu redor a saudade das praias da  infância

o fogo da fogueira aquece a brisa do mar
uma rua escura passa ao largo da foto
vacas e bois descansam na sombra do cajueiro
o estralo da pipoca na biloca que alcança o buraco

a descida que a ladeira oferece aos meus olhos
já não me sinto sentado na cadeira da escola
no parque os brinquedos são tão únicos e sérios
já não escuto a poesia que a vida da cidade padece.

Cgurgel



PÚS

sangro
do sangue
que

em mim

uma torrente
de
suor
e dor

uma permanente
ferida
que inunda
o coração do mundo.

Cgurgel
ASHES AND SNOW -  "Feather to Fire"



TEMPO

o mundo


fora
oco

tão vazio
de novidades

só o fogo
que escorre
pelas suas pálpebras.

Cgurgel



ALDEIA

transito
por entre
luvas
e lutas

transito
por entre
furacões
e balões

por entre
a noite
e o dia que há de vir

transito
por entre minha alma
e a calma do rio

exatamente
igual
quando deixei
todos os meus pertences
ao sabor
do meu próprio destino.

Cgurgel



LASSIDÃO

feérica forca
que me abate

como uma cordilheira
de lampejos e cadeados

e de tão
intransponível sufoco
durmo

por sobre
flores
e desvios

tão calmo
como o mar
que me tange
e me entrego.

Cgurgel



FERMENTO


que mais furtar
de brisas e furacões?

como um lampejo
de ossos e orifícios

lúdico lugar
que embriaga
pele e olhar

assim como
pousando
no luar
que amanhece

trânsito
de perdição
e brinquedo de criança.

Cgurgel

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

DEOLINDA - "Clandestino"




QUIMERA

pouco é o lugar
onde vivem
os que desejam
saber demais
sobre
tudo
do que a vida
berra

semelhante
a um monte
de esquecimentos

porque
mesmo
se não quiser-mos
tudo
que
daqui por diante
acontecer
será como uma chuva
de
lendas e fogueiras.

Cgurgel



AFORISMO


a curva da estrada
onde depositei milagres

está toda insepulta

como
os olhos das pessoas
que por ela
passam.

Cgurgel
bossa nova




MINHA CASA

na minha casa
habitam
passos e formigas

nas suas janelas
perpassam
silêncios e segredos

a minha casa
é tão tranquila
chega dar medo.

Cgurgel



CONFISSÃO

de tudo
do que aqui
já vi

me emociona
o silêncio
das árvores

e a sombra
por onde
o mundo
dorme
e recolhe
perdões.

Cgurgel



IMPACIÊNCIA

já não escuto
por entre a noite
que me aquece

a lembrança
que a vida
prolonga

como suspeita
que o ar
por onde
o tempo passa

o inesquecível
sentimento
que inunda
serras e desmaios.

Cgurgel